Guatemala: o silêncio que mata | Land Portal

Por Ilka Oliva Corado

Desde os tempos da ditadura, por gerações, ouvimos que “em boca fechada não entra mosca”. Será por isso que morremos pela boca e nos tornamos tão descarados e sem vergonha assim? Porque não se trata do medo pelo que os nossos avós viveram na ditadura, mas, sim, de ignorar a violência sofrida pelos povos originários, que sempre foram vistos como serviçais dos mestiços urbanos. Foram os povos indígenas os mais espancados, os mais empobrecidos, os mais explorados ao ponto de “ter o couro arrancado”, os que mais foram vítimas de assassinatos em massa.

Se há um grupo populacional na história da América Latina que mais tenha sofrido violações, certamente estamos falando dos povos originários, que sobreviveram por 500 anos a muitos episódios de genocídio e, no entanto, sua resistência é superior a de qualquer diploma universitário e rua asfaltada. Eles têm sido traídos repetidamente por mestiços humanistas que, valendo-se do silêncio, encobrem qualquer ato de violência perpetrado por governos, que, com seus tentáculos opressores, criminalizam toda e qualquer manifestação de denúncias e resistências levadas a cabo pelos povos originais.

O governo é o primeiro a negar aos indígenas o direito à educação, à saúde, a uma vida plena, obriga-os a serem os servos de latifundiários inescrupulosos e a servir até mesmo ao mestiço mais morto de fome da face da terra, em troca de uma ninharia. Os indígenas são obrigados a limpar as casas desse tipo de gente e a cuidar de seus filhos. Porque os indígenas são tratados, juntamente com os negros, como se fosse os últimos da fila, aqueles que carregam nas costas todos os males de uma sociedade imoral e traiçoeira, que se sente à vontade com a dignidade daqueles que continuam olhando para o futuro, mesmo que o sangue lhes escorra pelas têmporas e tenham os pés quebrados.

São as mãos dos indígenas as que constroem, as que mostram solidariedade; são as mesmas mãos que dão abrigo; são os indígenas que, apesar das lágrimas, têm olhos ainda capazes de vislumbrar as auroras de luta e resistência que mestiço algum é capaz de enxergar. São os indígenas que conhecem a terra e seus encantos; eles são capazes de ouvir a voz das montanhas, de enfrentar as tempestades que vêm do mar; são eles que têm a sabedoria dos rios e a nobreza dos vulcões. São eles que conhecem a imensidão da chuva e a pureza de cada pétala das flores silvestres.

Nós, os medíocres, os arrogantes, os mestiços urbanos, somos a traição e o silêncio que mata quando desviamos os olhares da violência governamental. Somos nós que nos enfiamos debaixo das nossas camas por nos sentirmos tão pequenos e covardes com medo da luz que emana do coração dos povos originários, dos indígenas que são sinônimo de garra, resistência e dignidade, com uma história de mais de 500 anos de luta. Nem os nossos canudos universitários, as nossas ruas asfaltadas e o teflon que nos fazem companhia debaixo de nossas camas têm lugar quando se trata de luta e integridade de caráter, porque, para isso, temos o exemplo dos professores dos professores, que, sem saber ler ou escrever, nos ensinam a defender a terra e a vida em solidariedade uns com os outros. Ah, Malaya! Somos bonzinhos; no entanto, traímos e silenciamos ao ouvirmos os tiros de metralhadoras e também manchamos nossas mãos de sangue porque, no final das contas, nesta sociedade de máscaras ninguém pode negar a própria origem.

Traduzido do espanhol por Ana Raquel Romeu / Revisado por José Luiz Corrêa

Esta matéria foi originalmente publicada em Preezensa